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ARTIGO OPINATIVO – O Super 16 é um dos assuntos no momento e em breve teremos novidades sobre o torneio de 2019. Mas a temporada 2020 já é assunto. Como já revelamos, o Super 16 do próximo ano deverá ser disputado ao longo do ano todo, com um modelo talvez próximo daquele que já defendi nesta coluna lá em 2017 (se não lembra, clique aqui). Na minha visão, está é uma evolução importante. Porém, não é ela a questão latente. O que mais gerou debate foi o valor de inscrição de 2020: 50 mil reais por clube, em um torneio que, em 2019, já teve baixas e que ainda (em agosto) não teve seus 16 participantes confirmados.

O novo responsável pelo Super 16, Renato “Renatão” Occhionero, já deixou claro que manteve o acordo feito em 2018 sobre o modelo da competição entre CBRu e clubes e que deverá abrir o debate o quanto antes para um novo modelo – de disputas e de inscrições – para a edição 2021.

Com isso em mente, precisamos entender a motivação do valor de 50 mil reais e como superá-lo. O motivo da proposta do valor era nobre: fazer os clubes investirem nas categorias de base e feminino e na capacitação de seus profissionais. Isso porque a CBRu praticou uma política de corte nos custos da inscrição, dando os seguintes descontos:

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  • Juvenil jogando 4 jogos por ano: 25%
  • Treinador WR nível 1: 5%
  • S&C WR nível 1: 5%
  • 1ºs Socorros nível 1 –1participante: 5%
  • Curso Árbitro nível 1 – 3 participantes: 5%
  • Sevens Feminino (Adulto ou Juvenil): 20%
  • Sevens Masculino Adulto: 15%

Isso significa que o valor poderia cair em 80%. No papel, eu achei uma solução extremamente positiva da CBRu naquele momento, mas um problema de ordem prática se impôs: os clubes mais frágeis – e, portanto, os que têm mais carência e, aos mesmo tempo, menos recursos financeiros – são os que pagariam mais em um primeiro momento – de modo geral, salvo exceções. Além disso, a geografia é sempre no Brasil um problema, seja para cursos, seja para atividades de categorias de base. Clubes mais isolados sofrem em frentes que clubes baseado na Grande São Paulo e arredores, por exemplo, não sofrem – ou sofrem menos.

Nessa perspectiva, o curto prazo impôs um torneio mais custoso a quem mais precisava justamente de dinheiro para se desenvolver. Ao invés de estimular quem mais carências tem, o modelo puniu tais clubes.

De um modo pragmático, é fato (e já defendi isso antes) que todo clube precisa saber quem ele é no presente e ter metas compatíveis. Isto é, vemos todo ano clubes que não têm condições de jogarem torneios a nível nacional se aventurando neles – para depois pagarem uma conta alta. Por outro lado, clubes que estão em estado com poucos eventos enxergam nos torneios nacionais uma sobrevivência para terem o que mostrar para apoiadores, prefeitura e mesmo para estimular seus próprios atletas e voluntários a seguirem engajados.

Minha conclusão é que por mais interessante que o modelo de descontos pareça, ele não se encaixa na realidade atual. Não creio que o desenvolvimento feminino precise estar atrelado ao masculino, por exemplo. O estímulo para o feminino precisa incidir diretamente sobre ele e não ser via masculino. Manter um time feminino escanteado não é evolução. Para ter um time cujo interesse da direção masculina é apenas burocrático, é melhor que o feminino se auto-organize, como ocorre muito Brasil afora, tendo poder decisório e controle financeiro sobre si. A evolução seria ter um clube que trabalhe sinergicamente masculino e feminino juntos e, para isso, é preciso que haja presença maior de mulheres na direção dos clubes.

E tanto composição das direções dos clubes como a questão dos cursos feitos por integrantes dos clubes precisam ser colocados como pré condições para a inscrição de equipes no futuro. Ter um treinador capacitado, por exemplo, não deveria gerar desconto: deveria ser condição para se jogar a primeira divisão nacional. Pois campeonato nacional é para quem tem um projeto técnico compatível com a elite nacional. Para projetos mais humildes já existem os estaduais. Entretanto, qualquer pré condição para inscrição precisa ser imposta com um tempo para adequação. E isto é um problema sério: quantas vezes a CBRu em sua história ameaçou impor times juvenis como condição de participação em torneios e não fez valer a exigência? Várias. Isso é um problema para ela mesma, uma vez que a não aplicação no passado dessas exigências cria um mal eterno, que é a “regra que não vinga”. Portanto, penso que pré requisitos administrativos e de capacitação técnica precisam ser discutidos, antes de mais nada, por quem tem capacitação para esse debate e, por isso, eu pessoalmente não pretendo dizer o que deve ser regra no futuro. É preciso aprimorar o debate sobre isso.

 

Como estimular os juvenis?

Mas, e a questão dos juvenis? Novamente, não creio que os descontos nas inscrições sejam o caminho para isso. Clubes que não têm hoje juvenis precisam focar seus recursos em se estruturarem para isso. No entanto, o atleta adulto não quer – e não aceita – ter suas chances de jogar um torneio diminuídas pelo fato de seu time ter ou não juvenis. Quem dirige o clube não consegue pensar no futuro nesse cenário, fica refém de uma situação sem solução a curto prazo. E sem engajamento de todos no curto prazo o longo prazo está comprometido pela iminente desmobilização – que é um fantasma que ronda muitos clubes sempre que ficam sem torneios.

Portanto, a saída parece ser, para mim, uma receita hoje aplicada em alguns países (sobretudo no primeiro escalão do rugby) e em vários outros esportes: base se estimula com benefício sentido dentro de campo imediatamente. Isto é, não pelo freio. Deixar um time mais pobre é freio.

Assim, poderíamos estudar a introdução de cotas de atletas formados em casa. França e Inglaterra, por exemplo, estimulam seus clubes a formarem atletas permitindo que os salários dos jogadores recém promovidos do juvenis sejam pagos por fora do teto salarial. Isso significa que quanto mais atletas formados recentemente em casa um clube do Top 14 ou da Premiership tem, mais dinheiro ele pode pagar para atletas consagrados, fortalecendo seu time em duas frentes.

No caso do rugby amador brasileiro, uma solução poderia ser estipular um percentual mínimo de atletas inscritos pelo clube no campeonato que estejam na equipe desde ao menos seus 20 anos de idade. Em outras palavras, uma cota de jogadores que estão no clube desde idade M20. No elenco do campeonato, não por jogo.

Isso levaria os clubes a necessariamente quererem revelar atletas, pois precisariam usar jogadores que estão desde o M20 na equipe – mesmo que o clube não tenha uma equipe M20 ativa. E os clubes teriam que provar no ato da inscrição do torneio (pelo CNRu) que contam com tais atletas, evitando a presença de clubes que jogam o torneio com elencos contados ou montados em cima da hora. É lógico que não se deve impedir inscrições posteriores de atletas, mas o núcleo do elenco já precisa estar montado e adequado. A garantia prévia de que os times têm… time… é essencial pro sucesso posterior do campeonato.

Além disso, a cota M20 também seria boa por não punir times de origem universitária e colocaria um freio na prática de clubes com mais recursos buscarem atletas revelados por outros clubes. Não extingue a prática, mas a racionalizaria.

Evidentemente, algumas adaptações seriam necessárias nos primeiros anos, pois muito clube não usa hoje corretamente o CNRu, que seria a ferramenta de validação. E, como já defendi antes, o CNRu precisa de um investimento urgente em sua modernização para poder “jogar junto”.

Com isto imposto, a política de valores de inscrições precisa ser baixa, bem baixa. Faria melhor para o torneio desonerar os clubes e garantir que eles ofereçam um evento (o dia do jogo) mais apresentável e melhor organizado, com mais divulgação, filmagem, e terceiro tempo que mobilize atletas e torcedores de modo atrativo. Isto é, menos custos prévios e mais investimento no dia a dia dos torneios. Numa realidade amadora, o que é gasto antes faz falta depois.

Faz sentido? Vamos amadurecer esta ideia?

1 COMENTÁRIO

  1. Victor, temos de ampliar a visão do universo do Rugby, sim a linha mestra pode ser M (20/18/16…) Afinal, um jogador formado na idade certa, tem muito mais possibilidade de ser um atleta de alto rendimento.
    Porém a cada afirmativa, se contrapõe um obstaculo. Manter divisões de base a muitos km dos adversários, estrutura de times que já tem dificuldade para viajar com um time adulto, vamos multiplicar esta dificuldade por 2x, 3x…
    Nada se falou do Universitário, desprezado. Em São Paulo, muitos times universitários jogam no Paulista A, B, C e D.
    Se temos de crescer a base de jogadores/ torcedores, o rugby universitário é um caminho. Assim como o rugby de escolas, que desapareceu e tem características diversas do rugby de clubes.
    Acho particularmente interessante a valorização de profissionais nos clubes. Técnicos, juízes, e outros.
    Não se fala nada em relação a infra estrutura. Centro de treinamento, qualidade do campo de jogo, etc.
    Temos de incentivar e ajudar os clubes a na sua evolução. Porém sem fixar uma fórmula única, “mágica”, nem por outro lado inviabilizar o acesso.