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Trazemos hoje para vocês uma entrevista especial com uma das auxiliares técnicas da seleção feminina do Brasil e do Charrua masculino, Lúcia Beatriz Ferreira. Lúcia foi jogadora da seleção feminina por muitos anos, assim como um dos principais nomes do clube gaúcho, e uma pessoa que mesmo sem conhecer de tão perto, aprendi a admirar pela liderança que exerce sobre o grupo e garra que defendeu a camisa vermelha do Charrua e a amarela do Brasil.
 
Espero que gostem!
 
 
Portal do Rugby – Você é a única treinadora de uma equipe masculina entre as principais equipes do país. Como decidiu assumir esse desafio? Enfrentou algum tipo de resistência?
 
Lúcia Ferreira – Levei em conta questões pessoais e profissionais. Achei que trabalhar com uma equipe masculina pudesse me ajudar a abrir outras portas. Sempre vou ser especialista em Sevens por causa da minha história. Mas queria ter essa experiencia de trabalhar ou com o Rugby infantil ou com o Rugby XV. E no caso surgiu a oportunidade de trabalhar com o adulto masculino do Charrua.
 
O desafio tem sido grande porque estou tendo que adaptar o meu conhecimento de Seven para o XV. Estou tendo que aprender bastante coisa sobre o XV como plano de jogo, mapas, ângulos de corrida dos backs, etc. 
Tive muita sorte com o grupo de jogadores que estou tendo a oportunidade de trabalhar com. Eles tem sido muito respeitosos e receptivos. Tem sido desafiador e gratificante trabalhar com eles.
 
 
PdR – Há quanto tempo está nessa função? Conta com auxiliares para fazer o seu trabalho?
 
LF – Eu assumi a função de auxiliar-técnica esse ano. O Guilherme Marques é o head coach da equipe. Eu auxilio ele com os backs e com o sistema de defesa. Mas quem planeja o jogo é ele. E tem sido desafiador ser auxiliar técnica. Isso foi uma das questões que levei em conta quando quis trabalhar com o masculino. Ter a oportunidade de ser auxiliar, mesma função que tenho na seleção. E ter que acatar decisões dos outros mesmo não concordando é difícil e como tudo requer prática em como lidar com essas questões. 
 
 
PdR – Você também é uma das auxiliares técnicas da seleção feminina do Brasil. Quais as principais diferenças entre treinar um grupo de mulheres e um grupo de homens? 
 
LF – Penso que a principal diferença entre treinar mulheres e homens é que a mulher não vai executar alguma coisa que ela não entenda e não saiba porque esta fazendo. Então mulher acaba falando muito durante os treinos e palpitando. Já com os guris eles pouco perguntam e tentam executar o que você pede mesmo não entendendo. E de uma maneira geral os guris parecem menos sensíveis as críticas do que as gurias. 
 
 
PdR – E as diferenças no preparo no que se refere XV ou Seven?
 
LF – São tantas as diferenças. Começando com o número de jogadores, sistema de jogo, numero de jogos em uma temporada, exigência física, tempo de jogo, habilidades individuais exigidas para o jogo, jogadores especialista e assim por diante.
 
Seven é um jogo muito mais intenso físico e mentalmente que o XV apesar de ser só 14min. Também não se tem tantos jogadores especialistas afinal todos tem que ser habilidosos e com boas tomadas de decisão. Isso por si só já diferencia do XV.
 
 
PdR – Sobre a seleção, o que mudou (para melhor ou pior) em relação ao tempo em que você esteve jogando, no que se refere à disciplina, preparo físico, etc?
 
LF – Hoje tem mais investimento do que tinha na época que eu jogava. Algumas jogadoras foram centralizadas em São Paulo para poder treinar todos os dias e melhorar física, técnica e taticamente. 
 
 
PdR – Como acha que sua experiência como jogadora ajuda no seu trabalho como treinadora? Você se considera uma referência tanto para as jogadoras do Charrua como para as da seleção?
 
LF – Ajuda a entender como são as competições, o que se sente e como lidar com isso. Expectativas e frustrações. Acabo tento empatia pelas jogadoras por de alguma maneira já ter passado pelo o que elas estão passando. Principalmente as jogadoras mais novas da seleção.
 
Nunca pensei a respeito de ser ou não uma referencia. Então não me considero assim. Só procuro fazer da melhor maneira possível o meu trabalho. Fazia isso como jogadora e tento fazer isso como treinadora. E eu só quero ver o rugby feminino do Brasil crescendo cada dia mais. Me traz satisfação quando vejo que ajudei alguém a se desenvolver e a chegar um pouco mais perto do seu sonho.
 
 
PdR – Quais os maiores desafios que já enfrentou na função de treinadora, e como você os compara com a época de jogadora? Quais são seus objetivos pessoais de médio/longo prazo nessa função?
 
LF – O maior desafio foi ser aceita pelo Charrua Feminino como treinadora. No inicio foi difícil para as jogadoras entenderem o meu papel e aceitarem o que eu estava propondo. Desafio bem diferente do que enfrentei como jogadora. Como jogadora era mais melhorar para estar bem e conseguir me manter na seleção.
 
Gostaria de ter mais claros os meus objetivos.  Gostaria de trabalhar com a seleção de desenvolvimento do Brasil. Mas a verdade é que no momento eu gostaria mesmo é de poder me dedicar 100% profissionalmente falando ao rugby. Mas isso ainda não é possível porque financeiramente ainda dependo dos meus outros empregos para me sustentar. Então de uma maneira em geral vou levando, tentado equilibrar todas as coisas. E torcendo para um dia ser treinadora profissional de rugby com dedicação exclusiva.
 
Foto: Dani Mayer/Fotojump