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“Tem interesse em fazer um coaching na África do Sul? A viagem termina com o jogo entre Springboks e Pumas, válido pelo novo Rugby Championship.”

Essa foi a pergunta que meu amigo Sérgio Jimenez me fez há uns quatro meses atrás para o curso de Coaching Aplicado.

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Veja o depoimento de Horácio Coutinho, presidente do Urutau Rugby (PR) sobre o que foi sem dúvida uma inesquecível experiência.

 

Pensei um pouco sobre os problemas que poderiam me trazer no trabalho, custos de viagem, como deixaria minha família por uns dias e em uns 2 segundos respondi: “Claro. Quando vamos?”

Assim começou a grande experiência de 10 dias na África do Sul, vivendo um rugby de altíssimo nível e toda a cultura e estrutura que esse país tem a oferecer sobre o esporte.

O curso que participamos é realizado por uma empresa argentina, porém, para facilitar o deslocamento, saímos de São Paulo, em direção a Johanesburgo e, depois, em direção a CapeTown, cidade que nos serviu de sede durante nossa estada no continente africano.

No primeiro dia fomos conhecer o estádio de Newlands, casa dos Stormers e do Western Province, em uma partida entre a equipe local e os Sharks, válida pela Currier Cup.

Estrutura belíssima com uma arquitetura inglesa, infinidade de produtos licenciados, cerveja sendo vendida dentro e fora do estádio e um povo educado. Essa foi a primeira impressão ao entrar na “arena” e acompanhar a preliminar entre os dois times na categoria M-19. Apesar da chuva e do frio, já foi possível reconhecer que o nível de jogo era infinitamente superior ao que vivemos no dia a dia. Um jogo muito tático, com muita intensidade e poucos erros de habilidades básicas. O estádio não encheu para a partida principal, em virtude do próprio tempo e dos times estarem desfalcados por emprestarem seus principais jogadores ao selecionado do país, os Springboks. Mesmo assim, cerca de 20 mil pessoas estavam presentes no local.

No segundo dia, seguimos para o Campus de um “College” local para acompanhar o primeiro treino dos Springboks. Durante aproximadamente duas horas assistimos warm-up, movimentações, treinos táticos, resfriamento e treinos de chute, com alguns dos principais nomes do rugby na atualidade. Apesar da importância desses jogadores para o esporte, são pessoas simples (com raras exceções) que tem o imenso prazer em representar o rugby e as cores da camisa que vestem.

O mesmo sentimento de diferença na intensidade, velocidade do jogo e força física fomos percebendo no decorrer das atividades.

Após o treino o Head Coach Heineken Meyer participou de um bate papo conosco. Falou sobre a importância da entrada da Argentina no torneio, ressaltando que das três nações que antes disputavam, a maior dificuldade encontrada pela África do Sul eram os grandes trajetos percorridos de avião e da dificuldade encontrada em recuperar e preparar os atletas em virtude disso. Efeito que os All Blacks e a Austrália encontravam apenas quando vinham jogar na casa dos Springboks. Outra dificuldade ressaltada pelo treinador Sul Africano era a intensidade da defesa Argentina.

O dia seguinte foi preenchido pelo treino dos Pumas, apelido carinhoso do selecionado argentino, no mesmo campo. O vento forte prejudicou um pouco, mas deixou evidente algumas diferenças estruturais no jogo das duas seleções.

Tackles mais baixos, jogo um pouco mais lento, uma certa ansiedade pela primeira participação no torneio e uma visível diferença na estatura dos jogadores eram as principais características visíveis. Similar ao dia anterior foi a atenção dada pelos jogadores e pela equipe técnica a nós que estávamos ali para aprender um pouco.

A tarde livre nos permitiu circular um pouco pela bela Cape Town e ver que o rugby está em todos os lugares. Lojas, esportivas ou não, quiosques vendendo bolas e produtos oficiais, pessoas nas ruas utilizando produtos licenciados, jogos sendo transmitidos em diversos horários nas televisões e campanhas publicitárias com os jogadores da seleção.

Voltando ao hotel encontramos um grupo de argentinos, da região de Córdoba, que faziam com seu clube (o Jockey Club) uma “gira” com jogadores acima de 35 anos. Mais uma experiência que gostaria muito de compartilhar com meus amigos de clube.

Encerramos o dia com uma aula com ninguém menos que Peter de Villiers, técnico dos Springboks de 2008 a 2011 e “filósofo” do esporte, que mostrou um pouco como o rugby está em constante mudança.

No dia seguinte fomos acompanhar novamente o treinamento dos Springboks e do Stormers no centro de treinamentos do Western Province. Dois campos bem cuidados, uma academia completa, refeitório, lavanderia, salas de tratamentos, salas de aulas e vestiários compunham o conjunto de sonho para qualquer clube brasileiro.

No treino do selecionado, formações fixas, habilidades básicas, chutes e alguns últimos ajustes para o jogo do final de semana.

Já no treino da equipe local, um warm-up e movimentações bem interessantes que nos mostraram mais detalhadamente os caminhos que levam ao jogo mais rápido e dinâmico que vem sendo implantado no país.

A sequência da “imersão” se deu na parte teórica. Jacques Nienaber, técnico de defesa dos Stormers deu a linha do que viria pela frente. Softwares modernos de análise, estatísticas e números precisos dão a direção das novas estratégias e táticas dos clubes no país. Mostrou e demonstrou sistemas de defesa, objetivos de estratégias, diferenças de jogo desde o mundial de 2011 na Nova Zelândia e ressaltou o que Tabai Matson já havia deixado de recado no Brasil: a ATITUDE do jogador ainda representa mais de 80% no conjunto de fatores que compõe um bom atleta. Ficou evidente a importância que se está dando ao duplo tackle e ao “ataque sem bola” no rugby de elite.

Ainda em sala de aula, Robbie Flack, ex-Springbok e atual treinador de ataque dos Springboks, manteve o discurso. Muitos números e estatísticas direcionam as estratégias de ataque das equipes do país. Em termos gerais, a direção seguida na África do Sul restringe os ataques com bola ao campo ofensivo, rucks extremamente dinâmicos, jogadas ensaiadas em pelo menos três fases previsíveis e sala de aula para os atletas antes de irem ao campo.

A sequência de aulas foi encerrada pelo ex-pilar da seleção escocesa, Matt Proudfoot, que focou seus ensinamentos no momento de contato. Manutenção ou recuperação da bola, proteções eficientes em rucks e movimentos dinâmicos foram o foco da conversa.

Nossa próxima parada, Stellenbosch, segunda colônia européia mais antiga do país. Cidade muito pequena, agradável, terra de vinhos, estudantes e também abriga o Western Province Institute. Centro de Alto Rendimento e formação de atletas da região.

Vários belos campos, porém, com chuva, fomos levados à quadra coberta, acarpetada com grama sintética que simula a largura exata de um campo e a extensão dos 30 metros finais.

Não só a estrutura impressionou como também, a aula teórica e prática sobre line e maul dada pelo coordenador geral do programa, Jacques Hanekon. Anexo a essa estrutura ficam os “singelos” alojamentos que abrigam os jovens aspirantes a jogadores profissionais. Os alojamentos também são a casa do Sprigboks Seven.

Um maravilhoso prédio, com salas muito bem decoradas, portas com acesso por meio de senha, piscina térmica e todo o aparato para se desenvolver atletas de alto rendimento estão presentes nesse centro de treinamento. Após nossas aulas, a seleção francesa M-19 utilizou as instalações para realizar os treinamentos de sua equipe. Por onde andávamos, o rugby de alto nível estava presente. Ainda havia tempo para Steph Nell, cabeça do programa, falar sobre contra ataque e jogo dentro da defesa.

A cada dia passava a ficar bem mais clara cada movimentação dos atletas em campo em qualquer um dos estágios do jogo.

Em nosso hotel, não bastavam os cordobeses em “gira”, chegaram também os garotos M-19 da seleção de Gales para os confrontos que teriam contra a seleção local e também contra os franceses, que havíamos encontrado em Stellenbosch.

Diego Cash, lendário Puma, que fez parte de um poderoso grupo de fowards e se caracterizou por criar a famosa “baixadinha” nas formações fixas de scrum, ministrou sua aula com foco nessa formação fixa.

Além dos treinos, restava ainda uma aula, que foi ministrada na véspera do jogo sobre “Análise de Jogos”, com Rassie Erasmus, ex-capitão dos Springboks e atual coordenador do programa de alto rendimento da seleção sul africana. Novamente números, estratégias, detalhes e força física embasaram a fala e fechavam com chave de ouro nossas atividades em sala de aula.

O último dia com o grupo foi de festa. O evento produzido antes do jogo pela marca patrocinadora da competição internacional no país incluía tendas, jogos sobre rugby, palco para torcedores demonstrarem sua paixão pelos clubes, hambúrgueres e muito, muito chopp.

Uma organização impecável garantiu que cerca de 50 mil torcedores misturados entrassem e saíssem do estádio sem nenhum problema visível. Em campo o que se viu foi uma superioridade dos Springboks sobre os “ansiosos” Pumas que se refletiu no placar. Vitória da seleção local por 27 a 6. Apesar da derrota nada abalou a energia dos técnicos argentinos que nos acompanhavam.

Despedimos-nos do grupo no dia seguinte com a certeza de que uma grande experiência dentro do esporte havia sido compartilhada. Ainda nos restou um momento para visitar o Cabo da Boa Esperança e torcer para que ela seja a última que morra em busca de um rugby organizado e de qualidade no Brasil.

Aos interessados em realizar viagens com seus clubes ou participar de cursos de coaching na África do Sul, entrar em contato através do e-mail horacio@agonbrasil.com.br. Estamos buscando parcerias para viabilizar essa experiência para outros interessados no Brasil.

 

Sergio Orlando Jiménez é consultor e treinador de Rugby, com passagens por clubes da primeira divisão argentina e selecionados regionais. No Brasil há 15 anos, já foi colaborador nas categorias de base da Seleção Brasileira, trenador do Desterro em 2010-2011 e hoje é técnico do Balneário Camboriú Rugby, além de desenvolver clínicas e projetos de expansão do Rugby em todo o Brasil.

 

Escrito por: Horácio Coutinho

Enviado por: Carlos Gustavo Woellner