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Por que os campeonatos estaduais precisam ser no começo do ano e o Super 8/16 e a Taça Tupi no segundo semestre? As respostas podem ser várias: os clubes são amadores e precisam de um início de ano mais “leve”? O estadual serve de preparação para o nacional? Os Tupis jogam mais no primeiro semestre e é preferível ter os atletas da seleção no nacional? Uma competição de cada vez ajuda no foco das equipes? O financiamento do nacional é mais custoso e ser no segundo semestre ajuda?

Sinceramente, todas essas respostas podem fazer sentido, mas nenhuma delas realmente justifica a opção pelo calendário atual. A questão aqui parece muito mais “cultural”, afinal, todo o esporte brasileiro (a começar pelo futebol) funciona com os estaduais e o nacional sendo disputados separadamente. E, na minha opinião, trata-se de um erro que custa muito ao planejamento anual dos clubes, em especial dos pequenos.

Como assim? Vamos passar a limpo o cenário atual:

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  • As primeiras divisões dos campeonatos estaduais em 2017 variaram de 3 rodadas (caso do Paraná) a 9 rodadas (caso de São Paulo). No Sul, há ainda a autônoma Liga Sul, que adiciona 4 partidas para seus participantes, o que significa que o representante do Rio Grande do Sul, o Farrapos, tenha sido o clube com mais jogos na primeira metade do ano, com 7 do estadual gaúcho e 4 da Liga Sul, totalizando 11;
  • O Super 16 de 2018 terá um limite de 11 partidas para seu campeão;
  • Equipes das primeiras divisões estaduais que não jogam os campeonatos nacionais têm um calendário vazio de rugby XV no segundo semestre. Apenas o Rio Grande do Sul, com a Copa RS, ofereceu atividades de XV a seus clubes eliminados na fase preliminar da Taça Tupi, enquanto o BC Rugby, do Catarinense, disputa uma competição independente (a Copa Norte/SC).
  • No total, 12 clubes entre Paraná (Urutau e Lobo Bravo), São Paulo (São Carlos), Rio de Janeiro (Itaguaí, Carioca, UFF, Maxambomba e Friburgo) e Minas Gerais (Uberlândia, Nova Lima, Inconfidência, Inconfidentes) não tiveram calendário de XV da segunda metade de julho a outubro. Se a temporada de XV deve ir de março a outubro (com novembro e dezembro para o sevens), há uma perda significativa de datas;
  • Os motivos das equipes variam para não entrarem na Taça Tupi: falta de atletas, falta de recursos financeiros ou longos deslocamentos. Se o limite dessas equipes está nos estaduais, a concentração de todos os seus jogos no primeiro semestre deixa um vácuo de atividades perigoso para a segunda parte do ano, até começarem os estaduais de sevens;

Portanto, há quase um equilíbrio de número de compromissos estaduais/regionais e nacional atualmente no rugby brasileiro. Com isso, por que não intercalar os jogos?

  • Com jogos de estadual intercalados com jogos de nacional, as competições da CBRu e das federações estaduais correriam de março e outubro igualmente;
  • Clubes mais estruturados, que disputam tanto estaduais como nacionais, poderiam manejar seus elencos colocando todos os atletas para jogarem nos mesmos meses, podendo ter flexibilidade de quando seus atletas “titulares” poderão. Se em um fim de semana o clube tem o nacional e no seguinte o estadual torna-se possível fazer um rodízio de jogadores melhor que mantenha todos os atletas motivados do começo ao fim da temporada;
  • Para os clubes com menor estrutura, que não pretendem jogar a Taça Tupi, ter apenas ou ou no máximo dois jogos por mês, com um calendário que dê conta do ano todo, é muito mais interessante (menos desgastante e melhor para o planejamento) do que concentrar todos os seus jogos em um espaço curto de tempo. As experiências do Paulista Séries B, C e D sugerem um benefício maior aos clubes e motivação maior a todo o plantel desses clubes.
  • Tal medida também evitaria que clubes sem real condição de jogarem XV por um ano inteiro deem um passo maior que a perna se aventurando em um campeonato que ainda não seja a realidade deles;
  • Evidentemente, as datas dos jogos dos Tupis podem ser melhor evitadas na montagem do calendário. No entanto, a sequência de maio (Sul-Americano) e junho (amistosos) obriga que pelo menos o estadual tenha algumas rodadas nesse período de qualquer forma. Porém, o fato de não ser a fase final desses campeonatos já seria um ganho;

Na Argentina, o Nacional de Clubes (que totaliza 6  rodadas de fase de grupos e 3 rodada de mata-mata) abre a temporada e os campeonatos regionais, que têm mais de 20 rodadas de duração, ocorrem na sequência. Para evitar que os clubes não classificados ao mata-mata do Nacional fiquem 3 semanas sem jogos, os campeonatos regionais passaram a ter seu início logo após a fase de grupos do Nacional, ao passo que os jogos do mata-mata foram espalhados pelos meses seguintes, com a final ocorrendo apenas em julho.

Tal ideia argentina traz à América do Sul o conceito das copas europeias. Na Europa, as ligas nacionais são disputadas ao longo do ano todo, de setembro e maio, enquanto as copas europeias (a Champions Cup e a Challenge Cup), no caso dos países profissionais, ou as copas nacionais, no caso dos países amadores, são disputadas entre as rodadas das ligas nacionais. Pegando o exemplo de Portugal, são 22 rodadas do campeonato nacional, 4 rodadas da copa nacional (Taça de Portugal), pelo menos 4 rodadas do Continental Shield e outras 2 rodadas entre Supercopa e Taça Ibérica. Ao contrário do Brasil, no entanto, na Argentina e na Europa há uma competição que domina o calendário (o que é importante ponderar, é claro).

Em um país com dimensões continentais como o Brasil (mesmo quando apenas participam do Super 16 e da Taça Tupi as equipes do Sul e Sudeste), esse modelo de duas competições paralelas atenderia às necessidade de todos os clubes: os pequenos teriam calendário de duração anual e os maiores teriam margem todo mês para planejarem o uso de seus elencos. Não temos um calendário de campeonato intercalado com copa, mas temos o nacional e os estaduais. O que significa que para um calendário com esse conceito ser implementado, seria preciso consenso entre CBRu, federações e clubes.

Excluindo-se os finais de semana que cairão em 2018 no meio de feriados prolongados nacionais (e que são preferidos para camps dos Tupis e folgas para os atletas amadores), há disponíveis 26 finais de semana da metade de março (após o fim do Americas Rugby Championship) ao final de outubro. Exemplo:

  • 2ª metade de Março: 2 fins de semana (1 estadual e 1 nacional)
  • Abril: 2 fins de semana (1 estadual e 1 nacional)
  • Maio: 4 fins de semana (3 coincidirão com o Sul-Americano) (1 estadual)
  • Junho: 5 fins de semana (até 3 coincidirão com os Tests dos Tupis) (1 estadual e 1 nacional)
  • Julho: 4 fins de semana (2 estaduais e 2 nacional)
  • Agosto: 4 fins de semana (2 estadual, 1 nacional + quartas nacional)
  • Setembro: 4 fins de semana (quartas nacional, semi estadual, semi nacional)
  • Outubro: 3 fins de semana (final estadual, final nacional)
  • Novembro e dezembro: seven-a-side

Com 26 datas em mãos, espalhadas por 8 meses, e apenas 18 datas previstas para os campeonatos nacionais e estaduais (9 para cada no máximo), é possível dar a todos os clubes de primeiras divisões estaduais 6 a 8 meses seguidos de competições de peso (oficiais e com grande valor) de rugby XV. E o mesmo período para as federações estaduais exporem seus melhores produtos, que ficariam “à mostra” por muito mais tempo, mesmo que sem alterarem seu número de jogos. Uma possível ampliação do número de jogos da temporada dos clubes de elite poderia ocorrer a partir da ampliação dos estaduais e/ou regionais igualmente sem modificações no conceito do calendário. Já a criação de uma liga, como a Pro Series proposta, igualmente não afetaria diretamente tal conceito uma vez que há finais de semana disponíveis para acomodação do calendário.

O sevens, nesta ideia, ficaria inteiramente no fim do ano, como era anteriormente. Mas o sevens seria assunto para outro artigo.

Então, por que não? Gostou da ideia? Compartilhe.

1 COMENTÁRIO

  1. Minha equipe joga a serie D Atualmente, e não acho benéfico um campeonato tão longo com jogos tão distantes as vezes ficamos 1 mês sem jogo.

    Porém tirando este ponto concordo com as demais ideias.. e possibilitaria usar melhor o elenco e também ter uma rodagem grande para os clubes, sem depender exclusivamente da cbru.