Foto: Bruno Ruas @ruasmidia

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Um embate que pela forma como se sente parece milenar, mas que na realidade só nasceu em 1932 e é um dos “pratos” mais apetecíveis do calendário anual da bola Oval. Falamos, claro está, da Bledisloe Cup, um troféu disputado entre australianos e neozelandeses a duas mãos (pode ir a uma terceira caso se registe uma vitória para cada lado, servindo de desempate) e que normalmente está inserido dentro do The Rugby Championship, sendo que em 2020 vai começar por ser decidido antes da competição das 4 maiores nações do Hemisfério Sul, alongando-se depois para dentro do próprio TRC. Ou seja, a 11 e 18 de Outubro All Blacks e Wallabies vão defrontar-se em solo neozelandês, mais especificamente em Wellington e Auckland, para depois disputarem mais dois jogos a 7 de Novembro e 12 de Dezembro, estendendo assim a Bledisloe Cup para uma série de 4 jogos, algo único na sua longa história e vale a pena perdermos umas linhas sobre mesma.

Quase 100 anos de história

Em 59 lutas pelo troféu, a Nova Zelândia foi capaz de somar 47 Bledisloes enquanto a Austrália somente segurou o título por 12 ocasiões, sendo que os All Blacks conseguiram manter a Bledisloe em suas mãos por 28 anos consecutivos, isto entre os anos de 1951 e 1978, que corresponde a 12 conquistas (em alguns anos não foi realizado esta mini-competição do Hemisfério Sul). Acelerando até aos dias de hoje, os All Blacks detêm atualmente o poder desta ligação Trans-Tasman, depois de terem reconquistado esta prata em 2003. Nos últimos 20 anos o duelo entre aussies kiwis subiu de tom, com os jornais locais de ambas as nações a subir o tom de conflito, sem esquecer a “agressividade” e entrega extra depositada pelos jogadores que procuram dominar esta rivalidade apaixonante, titânica e histórica, estando em jogo a honra e glória quer da Nova Zelândia ou Austrália.

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E o melhor argumento desportivo 2020 vai para ARU e NZRU

Posto esta rápida súmula da história da Bledisloe (recebeu este nome pelo seu criador, Lord Charles Bathurst, 1º visconde de Bledisloe) é altura para perceber o impacto de 2020 neste duelo entre ambas as nações, que neste ano terá tudo para ser considerado algo como decididamente dramático, começando pelo facto da Austrália ter “roubado” – de forma legal – a realização do The Rugby Championship.

A competição que coloca neozelandeses, australianos, argentinos e sul-africanos frente-a-frente a duas mãos, supostamente seria organizado e jogado na Nova Zelândia, premiando o esforço das instituições políticas e desportivas locais pelo esforço no combate ao SARS-CoV-2. Contudo, o governo kiwi, liderado por Jacinda Ardern (cujo partido lidera as pesquisas eleitorais da Nova Zelândia ao final de setembro), não foi capaz de dar o braço a torcer e aplicar medidas menos agressivas na chegada das comitivas extra-Nova Zelândia, querendo impor os 14 dias de total isolamento, sem acesso a campos de treino ou qualquer outra instalação, não prometendo igualmente se os jogos poderiam decorrer com público presente nas bancadas.

Perante a intransigência neozelandesa, a Austrália avançou com um pacote de medidas menos duras e provou que mesmo tendo casos cativos do vírus em questão, é possível realizar encontros desportivos em seu solo com público na bancada a presenciar os encontros. A NZRU, comandada por Mark Robinson (um dirigente que em pouco tempo tem sido responsável por decisões polêmicas e nada positivas para a modalidade), ficou incomodada com a situação, mas perante a situação não moveram quaisquer forças para lutar pela organização do The Rugby Championship. No entanto, foi encontrado uma espécie de meio-termo, com a realização de 50% da Bledisloe Cup em território neozelandês e os outros 50% já na Austrália.

Quando tudo parecia ter suavizado, a ARU (federação australiana) foi capaz de levantar o pano da controvérsia quando decidiu que o último encontro com a Nova Zelândia no TRC seria a 12 de Dezembro, forçando os atletas dos All Blacks a passar o Natal em quarentena forçada, mesmo que os testes revelassem como negativos. A troca de acusações foi mútua, a paz desfeita e ambos os países conferiram outra dose de “agressividade” a esta rivalidade centenária – espera-se que a primeira-ministra da Nova Zelândia reveja o protocolo sanitário-desportivo, de maneira a solidarizar-se com os seus atletas profissionais.

Temos portanto, calendário, história e contexto para a Bledisloe Cup 2020 e agora é altura de perceber quem tem possivelmente o favoritismo ou o elenco mais bem preparado para conquistar ou manter sob seu controlo a Bledisloe Cup!

Façam as vossas apostas

Não se sabe para já quais os elencos finais de Wallabies e All Blacks, pois enquanto os primeiros mantêm um grupo de trabalho na ordem dos 44 jogadores, já os neozelandeses parecem estar mais próximos da lista final, tendo no entanto ainda 36 elementos a treinar desde Setembro. Isto é, os novos selecionadores de ambas as nações, Dave Rennie e Ian Foster, optaram por alargar as listas de convocados de maneira a apurar na realidade quem são as unidades que vão encaixar melhor na estratégia delineada pelos dois técnicos, oferecendo assim uma hipótese a uma série de novidades de conseguirem ganhar um lugar e se estrear no Universo dos Test Matches.

Para perceber quem possivelmente detém a melhor dose de convocados é preciso ter em atenção três fatores: transição de atletas do Mundial de Rugby de 2019 para 2020; crescimento de novos jogadores em 2020 nos dois países; lesões e problemas físicos. Em relação ao primeiro ponto, foram os Wallabies que mais atletas perderam com as saídas de Kurtley Beale, Rory Arnold, Izack Rodda, Adam Coleman, Will Genia, Christian Lealiifano, Samu Kerevi e Adam Ashley-Cooper, sendo que os All Blacks viram nomes como Kieran Read, Brodie Retallick (temporariamente), Matt Todd, Ryan Crotty, Sonny Bill Williams e Ben Smith, fazendo assim uma transição menos conturbada e convoluta.

No que toca ao segundo ponto, tanto Nova Zelândia como Austrália viram o surgimento de vários novos nomes de boa e excelente qualidade ou reafirmação de outros que conseguiram ganhar força de novo, motivados tanto pelas campanhas no Super Rugby 2020, Super Rugby Aotearoa e Super Rugby AU, como Hoskins Sotutu, Ngani Laumape, Akira Ioane, Tupou Vaa’i, Tyrel Lomax, Dalton Papalii, Mitch Dunshea, Caleb Clarke ou Will Jordan nos All Blacks ou Noah Lolesio, Filipo Daugunu, Harry Johnson-Holmes, Fraser McReight, Jermain Ainsley, Lachlan Swinton, Harry Wilson, Hunter Paisami ou Irae Simone nos Wallabies. Apesar de todos os males do ano 2020, a verdade é que em termos do aparecimento de novas coqueluches ou crescimento de atletas que já o ano passado estavam a ser observados foi um ano excelente e promete alimentar as duas seleções com uma injeção de jovialidade e qualidade potente.

E em relação à última questão, nenhum dos contingentes apresenta problemas nessa frente, com só Braydon Ennor e Quinten Strange a saírem da convocatória dos All Blacks (nenhum seria titular e, no máximo, poderiam vir ocupar um lugar no banco de suplentes), enquanto os Wallabies não foram forçados a realizar qualquer alteração nos 44 convocados. Em termos de forma física, a questão só se coloca a Ngani Laumape, mas o centro só será utilizado no The Rugby Championship, e Noah Lolesio no grupo de trabalho australiano.

Posto isto, quem realmente tem o melhor XV e/ou 23? A Nova Zelândia parece ter o mais equilibrado e compacto, com uma avançada sólida, colocando-se só a questão de onde encaixar o capitão Sam Cane, uma vez que o asa esteve no Super Rugby Aotearoa atrás dos seus mais directos rivais, seja Shannon Frizell, Ardie Savea, Dalton Papali’i e Akira Ioane, lançando um desafio extremamente complicado a Ian Foster. Os All Blacks possuem uma linha de 3/4’s enriquecida pelo aspecto criativo, inteligência, volatilidade, velocidade e qualidade na execução de jogadas, com a dúvida a residir em quem vai fazer o papel do combo 10/15… Beauden Barrett com Jordie Barrett? Richie Mo’unga com Beauden Barrett? Richie Mo’unga com Jordie Barrett? Ou Beauden Barrett com Damian McKenzie?

Porém, e apesar de Dave Rennie ter de reconstruir a base dos Wallabies, a verdade é que detêm um grupo de atletas de belíssima qualidade e que vão criar sérios problemas aos All Blacks caso optem por se entregar a uma estratégia de ataque mais arriscada e uma avançada de trabalho constante. Questões principais: Liam Wright joga na 2ª ou 3ª linha? E o nº8 poderia ser o novato Harry Wilson, ou o experiente Pete Sam merece a oportunidade que lhe foi retirada no Mundial de Rugby passado? Já na linhas de 3/4’s James O’Connor deverá ser o médio-de-abertura depois de ter cumprido uma época de altíssimo nível pelos Wallabies, só que deixar Noah Lolesio de fora do 15 titular poderá ser um “crime”… quem seria a vossa escolha?

As dúvidas só serão dissipadas quando surgir a convocatória para Wallabies e All Blacks, mas aquilo que podemos prometer desde já é que vai ser uma luta de uma dimensão superior e com a necessidade dos dois selecionadores estreantes ganharem a confiança dos seus adeptos (e não só).

Um embate que pela forma como se sente parece milenar, mas que na realidade só nasceu em 1932 e é um dos “pratos” mais apetecíveis do calendário anual da bola Oval. Falamos, claro está, da Bledisloe Cup, um troféu disputado entre australianos e neozelandeses a duas mãos (pode ir a uma terceira caso se registre uma vitória para cada lado, servindo de desempate) e que normalmente está inserido dentro do The Rugby Championship, sendo que em 2020 vai começar por ser decidido antes da competição das 4 maiores nações do Hemisfério Sul, alongando-se depois para dentro do próprio TRC. Ou seja, a 11 e 18 de Outubro All Blacks e Wallabies vão defrontar-se em solo neozelandês, mais especificamente em Wellington e Auckland, para depois disputarem mais dois jogos a 7 de Novembro e 12 de Dezembro, estendendo assim a Bledisloe Cup para uma série de 4 jogos, algo único na sua longa história e vale a pena perdermos umas linhas sobre mesma.