Tamanduás e Ciervos ao final do encontro internacional de clubes LGBTI+ no SPAC

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No último sábado, os Tamanduás Bandeira receberam os argentinos do Ciervos Pampas, no primeiro jogo internacional de clubes LGBTI+ do país. O clube nos trouxe a crônica do evento mais que especial.

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Alarme programado para às 6:00, outro para às 6:17, mais um para às 6:20 e só pra garantir, mais um às 6:22. Só por via das dúvidas vou checar mala: chuteira, protetor bucal, uniforme, esparadrapo. Tudo certo. Será? Melhor checar de novo.

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Quando finalmente o sono vem, sonho com o jogo. Não me lembro do placar, mas acordo com a sensação de já ter entrado em campo, ter segurado a bola e correr em direção ao ingoal como nunca havia feito antes.

Meu nervosismo e ansiedade podem parecer exagerados para terceiros, mas esse não é só mais um amistoso ou um jogo qualquer. Nós estamos escrevendo um novo capítulo na história do esporte brasileiro e do Tamanduás-Bandeira, o que até então eu julgava ser um pensamento prepotente da minha parte.

Consegui acordar no horário certo e chegar ao SPAC com tempo de sobra, tempo até demais. Tempo suficiente para o campo e involuntariamente ser inundado por lembranças e sentimentos bons e ruins. Lembrei das vezes em que tentei jogar futebol, basquete e futebol americano, mas era “mole” demais. Agora eu entendo que na verdade, para aqueles times eu não era hétero ou cis o suficiente. E eu nunca vou ser, orgulhosamente.

Drop kick – começou o jogo.

Tentei me blindar de pensamentos externos e focar apenas na partida, nosso padrão de jogo, nas jogadas e meus colegas de time. Não sei se foi a adrenalina, o sangue correndo mais rápido pelo meu corpo ou que foi, mas resultou em um momento epifânico que mudou tudo.

Eu não estou jogando só por mim, mas também pelos jogadores não escalados que acordaram mais cedo do que eu para garantir que tudo correria bem, eu devia a cada um deles o meu melhor, porque tenho certeza que eles fariam o mesmo. Por todas as pessoas que não tiveram a mesma oportunidade que eu de encontrar um time que me acolheu e me celebra como eu sou. Pelo Ciervos Pampas Rugby Club, que veio de tão longe e merecem um adversário que corresponda às expectativas e por todos que de alguma forma nos apoiaram e fizeram parte da nossa história, até aquele exato momento em que segurei a oval nas mãos.

Foram os 80 minutos mais cansativos e estranhamente os mais rápidos da minha vida.

Natasha apitou – acabou o jogo

Assim como no meu sonho, não lembro o placar. Mas a sensação de ter corrido até o ingoal, limpado rucks, tacklear e ser tackleado nesse jogo, acho que nunca vou esquecer. Tampouco ver as lágrimas de felicidade escorrendo pelo rosto dos dos Ciervos, dos Tamanduás e meu também.

Abrimos a primeira garrafa – começou o terceiro tempo e à partir desse momento não posso confiar mais nas minhas memórias.

Escrito por: Tamanduás Bandeira