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Em tempos que o grande assunto é o alto rendimento e a profissionalização do esporte, é mais do que necessário fazer uma pausa nesses assuntos e trazer à pauta a essência do rugby: a paixão. Carlos Augusto Woellner, o Cagu, escreveu a crônica da partida heróica de seu clube, o Urutau, de Curitiba, que, diante das adversidades e de tantas baixas no elenco viajou a Guarapuava para enfrentar o Lobo Bravo, tudo por amor ao rugby e orgulho de formar um time de rugby. Vale a leitura.

 

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Uma semana após o jogo mais difícil do campeonato, contra o atual campeão e líder, teríamos de enfrentar nosso maior rival na batalha pela classificação às semifinais, isto devido a termos aceitado uma mudança na data da partida. Fato que gerou muito deste relato, mas que não tira a emoção deste e muito menos o mérito do Lobo Bravo Rugby.

Terça, 30 de abril, semana de jogo decisivo, mais um atleta se lesiona. Vamos em 18 apenas, tudo bem, não tínhamos muito mais no empate e embate histórico em Maringá…

Uma falha no regulamento, este votado pelos próprios clubes,  não permite mais inscrições, como se a maioria das equipes amadoras pudessem trazer atletas profissionais no momento que quisessem.

Quinta, dois dias antes do confronto. Todos os nomes definidos, mais duas baixas, o trabalho impossibilita a ida de um importante jogador, outro motivo a de outro, dos 16 restantes dois terão de vir do Rio de Janeiro se juntar ao grupo. Dos outros 14, três farão sua segunda partida, um sua primeira, começando em uma das posições mais ingratas, Full Back. Vários jogarão onde nunca jogaram, ou até mesmo pensaram em jogar. Uma brincadeira ao final do treino quase tira mais um dos guerreiros de campo.

Manhã de Sábado, um dos atletas não pôde vir do Rio, estamos em 15. A viagem é tranquila, conversas e mais conversas, como entrosar e animar uma equipe que nunca jogou daquela forma? Exatamente da maneira que foi feito, conversa, comunicação, entendimento… Os mais experientes a toda hora dão dicas para os mais novatos. Encontramos nosso capitão na chegada a Guarapuava, tão ou mais, incrivelmente, confiante que os outros, mesmo com todos os reveses dos últimos dias.

É chegada a hora da partida, e logo de início a confiança mostraria sinais de que havia um porque, aos 4 minutos try do Urutau. Parecia que tudo que falamos estava começando a se desenhar. Porém mais um revés havia de acontecer, 2 minutos depois, um de nossos novatos torce o joelho, tenta continuar em campo, sentimos sua vontade, mas também sua dor, e no próximo lance sente de novo e é obrigado a deixar a partida.

Seríamos 14 dentro de campo. E esta falta foi sentida quando o LBR marcou seu try saindo de um scrum e entrou no buraco da linha criado por esta ausência. E logo depois ao tomarmos mais um try.

Ainda assim, ao final da primeira etapa, jogando com 14 atletas, o placar constava LBR 10 x 5 Urutau.

Veio o intervalo e tentamos recuperar nossas energias, apesar de o LBR não ter aceitado 4 tempos de 20 minutos, nos concedeu 25 minutos de intervalo (mudados para 20 por medo da falta de iluminação natural) em uma atitude muito legal.

Começa o segundo tempo e ainda continuamos jogando de igual pra igual, apesar de uma pequena vantagem do adversário. Então aos 15 minutos em uma análise equivocada do árbitro (relatada em súmula por este após conferir o vídeo da partida), e que obviamente não se trata de culpa, afinal ele tomou a decisão com base no que viu e da maneira que achou correta, expulsa um atleta do Urutau. Seríamos 13…

E fomos 13 como se fôssemos 17. Verdade que tomamos mais 2 tries, mas em nenhum momento abrimos as pernas, e por algumas vezes tivemos a chance de aumentar o marcador. Assim como conseguimos parar o ataque de nossos adversários…

Ao final da partida restava de um lado a indignação pelos companheiros que não puderam vir, pelo erro cometido, mas que acontece, pelo nosso amigo lesionado, mas ao mesmo tempo um sentimento de alegria de poder estar ao lado dos amigos, dos irmãos de clube, que tanto fizeram e correram por todos que não estavam ali, e pelos que não puderam terminar o jogo ao seu lado.

A seguir um resumo do relato de alguns atletas com a melhor parte de cada um:

Sr. Luis Nicolliti

“Essa partida foi aonde pude ver o quão disposto cada um está a se doar, pelo time, e pelo os irmãos, o placar pode dizer ao contrario , mas os 15 jogadores que viajaram , com certeza saíram vitoriosos.”

Sr. Mike Khan

“Queria poder ter feito mais, e fiquei mal por isso, mas recolhendo os cacos do meu corpo hoje, tenho certeza que fiz mais do que os meus 100%, e tenho fé que meus companheiros estão sentindo o mesmo. Sinto-me vitorioso por poder fazer parte dessa etapa da nossa historia, e independentemente do motivo que alguns de nossos irmãos não puderam nos acompanhar na viagem, espero que eles possam se comprometer com o nosso desenvolvimento. URUMAUS”

Sr. Bruno Rosevics

“Apesar de duas baixas bem sentidas, ninguém desistiu e continuamos jogando como se estivéssemos muitas vezes com um jogador a mais (inclusive quando eles tomaram um cartão amarelo chegaram a falar que estavam com um jogador a menos, apesar de estarem na verdade com um a mais ainda) infelizmente diferente de outros esportes o rugby cobra muito do corpo e da mente, na mente ganhamos com certeza porem no corpo faltou um pouco para parar uma diferença de 1 e 2 jogadores em campo. Acabando o jogo ver o Fanta (treinador) que tem de rugby o que eu tenho de vida, chorar ao agradecer o jogo foi algo indescritível. Mais do que nunca provamos que estamos no caminho certo e temos muito trabalho ainda.”

Sr. André Kamikihara

“ Em alguns momentos da vida, o resultado torna-se menos relevante que o caminho que se toma para chegar até ele. No último sábado aconteceu exatamente isso. O placar final foi certamente menos importante do que a experiência para todos os que ali estiveram. Quem conhece o rugby sabe da exigência física e mental para disputar uma partida com 15 de cada lado, o que dizer de jogar com 1 atleta a menos a partir dos 5 minutos de partida e ainda perder mais 1 jogador faltando 25 minutos de jogo? O fato de não termos diminuído a intensidade do nosso jogo, conseguindo inclusive pressionar o adversário em diversos momentos mesmo com a desvantagem numérica, mostra a ATITUDE de todos que se doaram em campo e fora dele. Não há maneira melhor de mostrar respeito ao oponente do que jogar com dureza e seriedade, independentemente das adversidades. O Urutau mostrou a que veio e que está no caminho certo. Tenho orgulho de fazer parte dessa história. Bravíssimo URUTAU!”

 

Sr. Raphael Batta (atleta que veio do Rio para a partida)

“Caras… minha alegria por esse jogo começou ainda na noite de quarta-feira, quando em menos de 5 minutos juntamos uma vaquinha para poder contar com mais um jogador importante para o time.. isso me encheu de orgulho e me fez acreditar que esse seria o nosso jogo mais unido, mais incrível.. Quando soube que estaríamos em 15 pensei, car****.. esse jogo vai ser f***.. que irado! E foi exatamente como pensamos, pesado, jogado com inteligência e acima de tudo com uma garra que nunca vi em algum time antes.. estou com um orgulho imenso de cada guerreio que esteve presente e que fez o máximo para honrar cada companheiro ao seu lado.. a emoção que cada um deixou evidente após a partida só demonstrou que o melhor de cada foi dado.. valeu o esforço de ir e voltar em menos de 2 dias.. valeu o esforço de jogar 80 minutos.. valeu cada segundo ao lado de rugbiers sensacionais e de uma comissão técnica que soube tirar de cada atleta alem do seu limite.. Parabéns Urutau..”

Sr. Filipe Barolo (o novato que jogou de Full Back)

“ O coração estava batendo na garganta. Eu comecei jogando e sabia que teria que aguentar os 80 minutos com doação, garra , foco e muito suor. O desafio era assustador, tínhamos 15 exatamente, sem reservas. No início do segundo tempo contávamos apenas com 13, nossa força se converteu em um trem desenfreado, ali em campo sentia que fazia parte de uma unidade que podia derrubar qualquer gigante. Em equipe atacamos, defendemos e nos protegemos, como irmãos, como amigos e como atletas. Uma lealdade invejável que impede a qualquer um fazer perguntas sobre nossa união, pois frente ao combate estaremos sempre juntos. Perdemos, mas ao final, reconhecemos nos olhares que para cada um aquela batalha resultara em si numa vitória de força, de determinação, de um esforço que ultrapassou nossos limites e de um companheirismo inigualável. O Rugby me proporcionou emoções e alegrias que nunca havia sentido. Em nenhum dos 80 minutos me senti sozinho em campo, mesmo estando olhando para todos alguns metros a minha frente. Obrigado pela confiança, esse meu primeiro jogo será carregado em mente para toda minha vida, ao lembrar das expressões faciais de cada um de vocês que estavam naquele campo, dentro ou na linha lateral. U-RU-TAU!”

Sr. Carlos Gustavo Woellner (Cagu)

“Este foi meu primeiro cartão após o que tomei na minha primeira partida na vida, na qual eu não fazia nem ideia de como se tomava um cartão, e foi triste, quase chorei por diversas vezes após a expulsão, segurei as lágrimas, ou talvez tenha ficado tão feliz em sentir a união deste time, desse grupo, ver que o passo de ter ajudado a fundar tal equipe começa a mostrar resultados mesmo com todas as adversidades, que não consegui chorar. Tomar um cartão vermelho significa abandonar os irmãos de batalha, e, mesmo sabendo que não fiz o que o árbitro disse, assim me senti. E a única parte boa deste ter redigido uma correção quanto a este fato é que talvez não os tenha de abandonar na próxima partida e que assim, mesmo não precisando, pois sei da confiança que depositam em mim, mostrou que falei a verdade para todos estes guerreiros. Obrigado Urutau, obrigado Rugby, mais uma vez ensinando! Obrigado irmãos que correram por mim e por quem não pode estar ali naquele momento.”

Sr Jonathan Frost (Capitão)

“Mesmo com um time cansado, atletas machucados em campo e em desvantagem numérica, fizemos tudo o que era possível na defesa e ainda jogamos muito tempo atacando no campo do adversário! O orgulho foi imenso de ver nossos jogadores se doando ao máximo e felizes por poderem participar desse jogo! Buscamos mais um try até o último lance, e faltou muito pouco para conseguirmos.. Um jogo que vai ficar na memória. Muito orgulho de estar lá com meus irmãos e ser capitão nesse jogo! Coisas que só o Rugby proporciona!”

“E mais uma vez senti muito orgulho de fazer parte do Urutau Rugby!! Hoje foi mais uma dia para mostrarmos nossa força e união.. chegamos para o jogo sem reservas, jogamos 75 min. com 14 e quase 30 min. com 13.. E ninguém reclamou ou desanimou, ninguém se deu por vencido, todos encararam o jogo de frente, um belo jogo de rugby! Nada melhor do que sair com a sensação do dever cumprido, de ter deixado tudo em campo! O resultado foi Lobo Bravo 22 X 5 Urutau, mas nossa atitude em campo valeu muito mais! Um dia que com toda certeza será lembrado com carinho e orgulho por todos do nosso time! Bravíssimo Urutau!”

Sr. Luciano Johnson (Fanta) – treinador

“Para mim este jogo já havia iniciado quando aceitei a mudança de data, gerando desconforto e conflitos dentro do grupo. A expectativa de uma viagem tranquila foi brutalmente afetada no sábado de manhã, quando soube que realmente iríamos viajar somente em 15 e que isso seria um ingrediente indesejado. Como treinador tenho que ser o último a pensar em baixar a guarda e o primeiro em fazer de tudo para manter o moral do time. A viagem foi tranquila, e quando chegamos ao campo só tinha uma coisa em mente: Energizar o time, manter a calma e fazer de tudo para que a TENSÃO se transformasse em TESÃO. Jogo duro, Atani machucou feio no início, mas olhando em campo me lembrava de um filme (Campo dos Sonhos). Durante o jogo, o adversário se sentiu pressionado, jogou duro mas mesmo assim não mudou em nada a perspectiva da nossa equipe. O resultado não ajudou a equipe no campeonato, mas o jogo foi uma experiência única para cada um dos 18 Urutaus, nossos 15 guerreiros e os 3 da equipe técnica (Eu, Spock e Menotti). A sensação de vitória, sucesso e alegria era visível no olhar da cada jogador nosso. A viagem de volta foi uma explosão de alegria e consagração para cada um de nós!”

“Agradecimento !

Destes 27 anos de Rugby eu já participei dos mais variados tipos de jogos e tive ao meu lado uma variedade muito grande de companheiros que ficaram na lembrança.

Mas especialmente ontem, 04/05/2013, foi o dia de colocar no meu Hall da Fama 15 jogadores, que atuaram como guerreiros, verdadeiros Rugbiers. Tenho orgulho de poder estar ao lado de vocês em momento tão incrível. O que vocês fizeram ontem mexe com a cabeça de qualquer um.

 

 

Por: Carlos Gustavo Woellner