lusa lions

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Foi-me dada uma missão por um dos criadores do Portal para criar artigos abrangendo a parte que incomoda os rugbiers brasileiros em geral. Já havia escrito – bem mal formatado – um artigo sobre esse lado. Agora tentarei fazer disso uma ajuda.

Imagine que o Rugby seja uma pessoa. Certamente seria uma pessoa com valores nobres: de respeitar a autoridade, os adversários, lutar pelos companheiros de time e zelar pelo altruísmo. Uma pessoa que queremos que seja exemplo para as outras pessoas – outros esportes. Mas de acordo com parte dos rugbiers, essa pessoa nobre tem seus defeitos: como o fato de odiar seu irmão mais novo, um moleque mimado pelo dinheiro e que ganha mais atenção fazendo menos e com muita proteção. Se o Rugby é essa pessoa nobre, o futebol americano certamente é esse irmão mais novo.

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Fica estranho imaginar o rugby dessa forma, devemos mesmo pensar sobre o futebol americano dessa forma? Como ele pode nos ajudar a entender quem somos e a nos desenvolver?

A ideia desse texto surgiu quando à convite dos meus companheiros de sala da EEFE-USP fui fazer o draft da Lusa Lions e me espantei com o número de interessados. Junto comigo havia cerca de outras 250 pessoas fazendo os testes, entre 14 a 30 anos. Poucos são aprovados no final – graças ao rugby fui um deles – e em três grupos são encaminhados: o time de desenvolvimento, o flag e o time principal. Tudo muito bem estruturado para o desenvolvimento dos jogadores e a evolução do esporte.

Com isso quis saber quais foram os passos dados para ter esse sucesso e se realmente somos tão diferentes como as provocações em redes sociais mostram.

O número de participantes do draft já não é surpresa para as equipes que participam do Torneio Touchdown, o equivalente ao campeonato brasileiro de futebol americano, que conta com 20 equipes. A média de uma seletiva varia entre 120 a 250 participantes em times situados, por exemplo, em Santa Catarina, Espírito Santo, Mato Grosso e Distrito Federal. Parte do sucesso se deve a divulgação bem prévia e constante pelas redes sociais. No caso da Lusa Lions, três meses antes do draft já estava definido as datas e local, além de possuir um site próprio e da inscrição ter que ser realizada no site, com avisos automáticos por e-mail. E o fato de ser um draft valoriza o processo de ingresso ao time, fazendo com que o interessado realmente mostre valor e potencial.

Talvez esse seja o grande ponto no qual o rugby peca, a meu ver: de se valorizar para ser valorizado. Porque fora isso, compartilhamos os mesmos problemas. Se em alguns lugares achamos o rugby muito custoso, para um jogador de futebol americano poder jogar ele tem que em média gastar 700 reais pelo capacete e 800 reais pelas ombreiras.

Outros dois pontos que compartilhamos muito em comum está relacionado ao desenvolvimento dos treinadores e comissão técnica e a influência dos jogadores estrangeiros nos times.

Basicamente, o desenvolvimento dos treinadores de FA é na raça, assim como nós. Não existe um centro de formação de treinadores e uma linha de raciocínio única para formar um estilo brasileiro de jogar FA. Assim como no rugby brasileiro, onde a influência das mais diversas nacionalidades para a formação das nossas bases não conseguimos desenvolver um estilo completamente brasileiro de jogar e desenvolver o rugby – embora o trabalho feito nos últimos anos encaminhe para isso.

A especialização dos treinadores é uma batalha que tem se encaminhada para algumas soluções práticas, pelo menos no FA. É possível dizer que o altruísmo reúne os treinadores para uma troca de experiências e materiais de treino para o desenvolvimento das equipes em um grupo de Facebook, onde uma espécie de enciclopédia do FA está sendo montada e disponibilizada para os times e treinadores em geral. Além dos tradicionais vídeos do Youtube, há uma grande comercialização interna de livros e DVDs oficiais dos treinadores consagrados da NFL com o desenvolvimento de táticas, técnicas e físico dos atletas.

Uma crítica que faço aqui é que no rugby contamos com o mesmo tipo de material, mas não se vê troca de material que fuja do banal de uns cliques no Google. No FA, a maioria dos treinadores não são ex-jogadores da NFL ou College Football, mas são estudantes ou graduados de Educação Física que saibam aplicar os treinos físicos e técnicos de acordo com os níveis motores e coordenativos.

Compartilhamos também a polêmica dos estrangeiros tendo um caminho supostamente facilitado. Assim como tivemos recentemente a procura da CBRu por jogadores estrangeiros para fazerem parte da seleção adulta, alguns treinadores do FA mantem contato com jogadores profissionais nos EUA. Antigamente, a tática era deixar esses estrangeiros inscritos e nas fases finais e eliminatórias eles viajarem para o Brasil – com o time pagando as despesas -, jogarem só uma partida e voltarem para casa. Atualmente, pelo nível em que as equipes se encontram essa tática já não é mais garantia de vitória, muito pelo compromisso em conjunto de desenvolver jogadores o nível tem se elevado cada vez mais.

E ainda vale ressaltar a dificuldade extra que o futebol americano tem: ele não é um esporte olímpico, não tendo disponíveis os mesmos recursos e incentivos governamentais que o rugby há poucos anos passou a contar. Se o apelo da NFL é grande a favor do FA, o apelo dos Jogos Olímpicos é do rugby, que ainda tem a tradição dos jogos entre seleções nacionais e o sonho de uma Copa do Mundo de maior visibilidade que a do FA a seu favor.

Lembrando-se do começo do texto, no qual descrevi a pessoa com nobres valores que detestava seu irmão mais novo, a conclusão que fica ao final é a de que ambos são parecidos e compartilham dos mesmos problemas. Trocas de experiências podem fazer ambos evoluírem, não se anularem, como muitos temem. E acho que o FA brasileiro tem muitos exemplos, como os citados, que podem nos ajudar.

Quem que tem um irmão caçula nunca teve que pedir ajuda a ele pra encobertar uns problemas do irmão mais velho para os pais, hein?

 

Escrito por: Leandro Luccas Santos