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Naquele que foi o jogo mais fraco do Tri Nations 2020, o Austrália-Argentina trouxe pouco rugby contínuo e de qualidade oferecendo no seu lugar um embate puramente físico e de duas equipas que queriam pela força fazer a diferença no campo e resultado, com um empate a resultar desta “estratégia”.
Esta é a análise ao que se passou no 4º jogo da maior competição de seleções do Hemisfério Sul…
MVPs: Bautista Delguy (Argentina) e Nic White (Austrália)
Do paupérrimo rugby que foi visto, revisto e analisado do encontro entre Pumas e Wallabies, foram poucos os jogadores a se sobressaírem e a merecerem uma nota positiva, sendo que ainda menos foram aqueles que realmente atingiram um patamar elevado de qualidade. Perante a indecisão e a razia de escolhas, a opção recaiu em dois nomes que compartilham o prêmio de melhor da semana… o argentino, Bautista Delguy, e o australiano, Nic White.
O ponta dos Pumas foi um dos poucos a realmente a procurar dar outro brilhantismo a um encontro pobre, dançando quase autenticamente o tango graças a um jogo de pés de elevada categoria, ludibriando adversários como Michael Hooper ou Marika Koroibete (foi deixado para trás por uma ocasião no duelo com Delguy), focando-se a não procurar o contacto mas sim o espaço que possibilitasse inventar uma quebra e saída para uma jogada de grande perigo. Os números finais de Bautista Delguy são de qualidade e merecem ser aqui apontados: 60 metros conquistados, 3 quebras de linha, 5 defensores batidos, 2 offloads, 2 tackle busts, 0 erros na conquista de bola no ar, 4 tackles efetivos (nenhum perdido).
Já Nic White voltou ao seu melhor no que toca à análise rápida do tabuleiro de jogo, no dar ordens bem formatadas e inteligíveis e no apresentar uma transmissão de bola segura e eficiente, somando-se ainda as tentativas – algumas bem sucedidas – de enganar a primeira cortina defensiva da Argentina, com estes a pressionarem pouco o formação na saída de bola.
O nº9 dos Wallabies não procurou inventar tanto na manobra atacante, até porque o seu parceiro de par de médios, Reece Hodge, não transmitiu confiança suficiente para procurarem e encontrarem caminhos de desbloquear a muralha defensiva dos Pumas, forçando então a White a optar pelo jogo seguro e de manutenção da posse de bola na maior parte dos períodos em que tiveram a bola em seu poder. Nota ainda para os excelentes pontapés a partir de ruck – só por uma vez correu mal -, em que o formação foi capaz de conquistar vários metros através do pé em situações críticas para a Austrália.
THE TACKLING MACHINE: MATÍAS ALEMMANO (ARGENTINA)
Tackling machine: Matías Alemanno (Argentina)
Marcus Kremer foi quem mais tacleou de entre as duas equipas, mas foi também o jogador que mais falhas fez na defesa, com cinco tackles perdidos, com duas delas a gerarem jogadas de alto perigo para os Wallabies que por pura falta de visão de jogo do seu abertura não conseguiram fazer melhor. Ou seja, o tacleador da semana não vai para quem fez mais tackles, mas sim para os jogadores que conseguiram placar melhor e falhar menos, neste caso Matías Alemanno dos Pumas. O 2ª linha foi capaz de colocar bem os ombros por 13 ocasiões, ostentando sempre uma agressividade letal no momento do impacto e uma técnica bem apetrechada e desenvolvida, apesar da dimensão física que por vezes cria problemas em conseguir se baixar e garantir o tal tackle de qualidade.
Das 13 tackles conseguidos, 3 delas foram dominantes, arrastando os adversários para trás e a dar um poder galvanizador aos seus colegas de equipa que mantiveram os mesmos índices de foco e intensidade física no decorrer do duelo contra os seus adversários australianos.
Não foi um nome interessante no espectro ofensivo, cumpriu sempre no jogo parado onde até roubou duas bolas nos alinhamentos da Austrália e manteve uma atitude inquebrável no decorrer do jogo, mesmo quando parecia que os seus adversários iriam conseguir fazer mais pontos.
O melhor treinador: nenhum
Foi o pior encontro deste Tri Nations até ao momento, naquilo que começa a ser um típico jogo entre Wallabies e Pumas, isto é, desgastante, extremamente físico, de procura de avanço territorial a partir quase sempre do jogo ao pé, de pouco (ou nenhum) risco e de entrega a pequenas picardias que se vão amontoando no decorrer do tempo. Nem Dave Rennie ou Mario Ledesma tiveram o engenho para dar as ferramentas necessários aos seus comandados para oferecerem um espetáculo de franca qualidade, com o selecionador australiano a ver a sua equipa a ter pouco capricho na transmissão e movimentação da oval, enquanto o homem forte dos argentinos não foi capaz de sair da “concha” de segurança do jogo de procura de penalidades no breakdown e de pouca versatilidade nas linhas atrasadas.
As duas defesas foram monumentais nos detalhes que poderiam ter mudado o rumo dos acontecimentos, não há dúvidas disso sim, seja aquela sequência ininterrupta de tackles dos Pumas na primeira parte em que evitaram o try da Austrália, enquanto os Wallabies foram capazes de recuperar a oval quando estavam dentro dos seus últimos 10 metros naquilo que parecia ser o momento da reviravolta argentina. Mas o rugby não é só defesa, não é só fisicalidade pura e dura e também não pode ser um show de atitudes, especialmente aquelas em que os jogadores não param de reclamar ou falar com o árbitro, incluído capitães, com nota negativa para a maneira como Pablo Matera tentou uma e outra vez reverter decisões através de constantes críticas infundadas.
O encontro foi sobretudo emotivo pela maneira como podia ter acabado, já que a Austrália chegou a ter nos pés a vitória aos 77 minutos com Reece Hodge a sucumbir à pressão – o pontapé era difícil mas o abertura podia ter feito melhor -, enquanto os Pumas foram capazes de recuperar uma bola inesperada num ruck e atiraram um grubber que causou pânico aos adeptos australianos, mas que acabou por ser sanado por Jake Gordon, com o formação suplente a captar a bola e atirar-se para fora. Contudo, nenhuma das equipas foi capaz de ser melhor quando importava e por razões diferentes, com a nota de “culpa” a pertencer a ambos selecionadores.
Das poucas jogadas para try dos Wallabies (1:11)
O(S) LET DOWN(S): NO TRIES, NO PARTY
A decepção: no tries, no party
Mudando de tema, mas mantendo a narrativa anterior, é ver que nenhuma das duas seleções foi capaz de fazer melhor mas por razões diferentes, começando pela Austrália. 553 metros com a bola em seu poder, 6 quebras de linha, 18 jogadores batidos e 11 offloads, significaram no fim dos 80 minutos zero tries.
Como? Se os australianos tiveram capacidade para sair a atacar de dentro do seu meio-campo, explorando bem os poucos espaços concedidos pela defensiva argentina, já quando chegavam aos 22 metros dos Pumas tudo acabou mal, tanto pela paupérrima qualidade de passe quando tinham de transmitir a oval carregada de intenção de fazer a diferença, ou pela falta de criatividade e sentido de risco, optando por se deixarem ir num jogo atabalhoado do bloco avançado, sem esquecer a franca eficiência da parte de Reece Hodge para funcionar como um abertura de rugby contínuo, estando dentro de campos devido ao seu potente pontapé seja na conversão aos postes ou tático.
Do outro lado, os Pumas simplesmente não criaram oportunidades de try, excetuando-se duas situações, ambas surgindo nos últimos 15 minutos e vieram igualmente do mesmo tipo de solução, o jogo ao pé curto pelo ar. Mas de resto, não houve mais nada assinalável para o lado da Argentina quando se fala em combinações de ataque de qualidade para lá do seu meio-campo defensivo, indo sempre à procura das mesmas plataformas de ataque, de criar o mesmo tipo de engage com a defesa da Austrália e sem a vontade de arriscar ou de querer criar algo mais positivo em termos do rugby contínuo ou moderno, apesar de Nicolás Sánchez ter procurado a profundidade que nunca foi bem correspondida pelo seu par de centros ou nº15.
Pobre em ataque, um deserto de tries, poucas ideias criativas, nenhuma vontade de arriscar e sem o “fogo” necessário para dar outra vibração a um encontro que já se esperava ser extremamente físico.
Números
Mais metros conquistados: Reece Hodge (Austrália) – 80 metros;
Mais tackles: Matías Alemanno (Argentina) – 13 tackles (1 perdido);
Mais turnovers: Vários – 1;
Melhor marcador de tries: Nenhum;
Mais defensores batidos: Bautista Delguy (Argentina) – 5;
MVP do Fair Play: Nicolás Sánchez (Argentina)