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womens rugby

A história do rugby feminino é ainda muito pouco trabalhada, mas o site estadunidense Scrumhalf Connection publicou um excelente artigo sobre as primeiras experiências de mulheres no esporte. O artigo original pode ser acessado diretamente neste link em inglês.

Até então, os relatos mais precisos documentavam as primeiras experiência de times femininos no rugby em 1891, e da participação de mulheres nos jogos em 1887. No entanto, apenas a partir da Primeira Grande Guerra Mundial – 1914-18 – a participação de mulheres no esporte se intensificou, impulsinada pelos movimentos feministas e pela maior participação da mulher na vida pública. Da mesma maneira, foi intensificada a oposição masculina ao esporte feminino que, infelizmente, ainda está presente. Revelador nesse sentido é o fato de que na Inglaterra apenas em 1983 o rugby feminino passou a ser organizado por uma federação: a Women’s Rugby Football Union, incorporada apenas nos anos 90 pela RFU. Foi justamente apenas a partir dos anos 1980, cem anos após as primeiras experiências de mulheres no rugby, que a modalidade feminino começou a conquistar seu espaço e ganhar reconhecimento.

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Rugby Feminino em… 1881? [início do artigo do Scrumhalf Connaction]

Três anos atrás, o site Scrum Queens revelou o notável feito de Emily Valentine, estudante de Ulster [Irlanda] que jogou rugby pelo Portora Royal School em 1887 – o registro mais antigo de uma mulher jogando rugby. Conforme foi dito na época, ela provavelmente não está só, e agora há evidência de que as mulheres podem ter jogado até seis anos antes.

A descoberta – em uma série de jornais daquela época – não é prova tão clara e inequívoca quanto aos feitos registrados de Emily, mas é mais fascinante pelo que revela sobre o desenvolvimento dos códigos do “football” e o comportamento da mídia e população da Era Vitoriana em relação à mulheres que jogassem esse tipo de esporte. Nos idos de 1870 e 1880, não era completamente claro o que era chamado de “football”. O código do Football Association (o futebol de hoje) tinha menos de vinte anos, e ainda estava começando a divergir de forma mais significativa do Rugby Football.  Como resultado, clubes e times alternavam frequentemente de códigos, e eventos anunciados como “football matches” (especialmente quando não faziam parte de um torneio oficial) podiam ser jogados em qualquer código – ou variações acordadas previamente.

No início do verão de 1881, um grupo de mulheres vindo da Escócia iniciaram um tour, jogando “football” em diversas cidades daquela país e do norte da Inglaterra. As mulheres jogavam como Escócia X Inglaterra, apesar de ser impossível precisar quantas eram realmente inglesas ou escocesas (existe evidência de que os times mudavam de formação para nivelar o jogo). Era um evento comercial, e os preços eram altos, variando de um a dois xelins cada (o que equivale a cerca de 20 libras nos dias de hoje e muito mais do que se pagaria para um jogo masculino na época, por exemplo). Apesar do grande público assistindo os primeiros jogos, as notícias de jornais locais eram pouco lisonjeiros, e a atitude do público era algo longe do positivo, com diversos jogos sendo encerrados antes do término devido a tumultos iniciados extra-campo.

Pelas reportagens da época, fica claro que os jogos foram disputados nas regras do Football Association, mas em 25 de junho (depois de fugir de um tumulto em Manchester quatro dias antes, quando o responsável pelo campo ainda se apossou da renda da partida) as mulheres chegam a Liverpool, e algo muda. Uma reportagem no Liverpool Mercury de 27 de junho – depois de detalhar a vestimenta das jogadoras – descreve como a Escócia “conseguiu anotar diversos touchdowns e um gol” no primeiro tempo, antes de “forçar as inglesas contra seu próprio gol e marcou vários touchdowns” no segundo tempo. No final, a Escócia venceu por dois gols a um, um placar comum para os jogos da época, uma vez que tries e conversões só foram introduzidos cinco anos depois.

Então… será que elas estavam efetivamente jogando rugby? Se estavam, então as reportagens indicam que as mesmas foram jogadas em um formato com onze ou doze jogadoras de cada lado, mas ao mesmo tempo, algumas passagens deixam margem à dúvida, por exemplo quando diz que o gol inglês ocorreu não após um touchdown, mas “com muito ímpeto, quando conseguiram levar a bola adiante e anotar um gol.” As regras do rugby à época permitia a realização de field goals, e não há menção se a bola foi carregada ou chutada adiante, antes de anotar o gol. A verdade é que nunca será possível determinar o que ocorreu no Cattle Market Inn Athletic Grounds, em Stanley, Liverpool, mas outro fato intrigante surge.  Eis uma caixa de cigarros de 1895 que mostra uma mulher correndo com uma bola que parece ser de rugby, utilizando vestimentas similar às descritas em 1881, produzido pela Ogdens, empresa de Liverpool, onde um dos jogos descritos acima aconteceu. Quem sabe esse não foi um acontecimento isolado no norte da Inglaterra?

Assim, enquanto Emily Valentine continua sendo o “primeiro nome” da história do rugby feminino, ela possivelmente foi apenas um topo de uma montanha escondida do interesse (e também da participação) feminina em todos os códigos do futebol no final do século XIX. Quem sabe, em algum lugar exista mais a ser descoberto!

Agradecimentos a Patrick Brennan, compilador do site sobre história do Football Association de Donmouth, que revelou essas matérias, e que podem ser lidas na íntegra nesse link (em inglês).

Também agradecemos ao colecionador Frederic Humbert, que revelou a caixa de cigarro de 1895 e muitos outros itens históricos que podem ser encontrados em seu site Rugby Pioneers (em francês)

 

Nota da tradução:

No texto do Scrumhalf Connection, a redatora não comenta o que parece ser a prova mais forte de que algumas partidas foram disputadas no código Rugby Football que é a realização de um meleé (possivelmente um scrum, fazendo associação com o termo usado em francês, ou mesmo um maul) perto do gol adversário, no recorte de 28/5/1881 do BlackBurn Standard.